O desenvolvimento do capital intelectual é uma prioridade para no dia a dia das organizações, afinal são as pessoas que fazem o diferencial para qualquer negócio.

Dentro desse contexto, encontram-se vários recursos para que os profissionais aprimorem suas competências e, consequentemente, ofereçam uma melhor entrega à empresa.

Um se destaca: o mentoring – processo que ocorre através de um relacionamento em que uma pessoa, com base em seu conhecimento e experiência, estimula e influencia o desenvolvimento cognitivo, profissional, social ou emocional de outra.

Segundo Paulo Erlich, diretor da Lumina Consultoria, consultor em mentoring organizacional e coach pessoal e executivo, ainda existe uma confusão conceitual enorme, principalmente entre mentoring e coaching, porque há fortes semelhanças e até a literatura científica que trata desses temas não é clara.

“No processo de mentoring, o mentor informa e orienta o mentorado sobre as questões de trabalho e carreira e sobre os meandros da organização, protege-o de situações que comprometam a imagem profissional, dá a ele visibilidade para que pares e superiores percebam o seu progresso e até o patrocina, defendendo para ele melhores posições na organização”, explica.

Em entrevista concedida ao RH.com.br, o consultor apresenta os principais fatores que caracterizam o mentoring e destaca quando e como esse processo pode ser aplicado.  Tenha uma agradável leitura!

RH.com.br – Quais as principais características do processo de mentoring?

Paulo Erlich – Vou responder focado no mentoring “um a um” e que ocorre no ambiente organizacional, está bem? Digo isso porque pode haver mentoring em grupo e, também, porque ele pode acontecer nos mais diversos contextos da vida. Sendo assim, podemos dizer que mentoring é um processo que ocorre através de um relacionamento em que uma pessoa, com base em seu conhecimento e experiência, estimula e influencia o desenvolvimento cognitivo, profissional, social ou emocional de outra. É uma relação de apoio, de suporte social que, quando bem aplicada, torna-se uma poderosa ferramenta de crescimento individual e organizacional.

RH – Ainda existe certa confusão sobre a interpretação correta do conceito de mentoring?

Paulo Erlich – Existe uma confusão conceitual enorme, principalmente entre mentoring e coaching, porque há fortes semelhanças e até a literatura científica que trata desses temas não é clara. Eu não me convenci quanto à distinção entre os dois processos até que, depois de estudar em profundidade as bases teóricas de ambos, parti para aplicá-los, vivê-los na prática. Aí, apesar das sutilezas, diferenças se ressaltaram.

RH – E o que faz essa diferença?
Paulo Erlich – Vamos comparar o mentoring organizacional – o mentor sendo alguém da própria organização do mentorado – com o coaching oferecido por profissional de fora da organização, está bem?

Vamos por partes.
Primeiro, sobre mentoring. O mentor informa e orienta o mentorado sobre as questões de trabalho e carreira e sobre os meandros da organização, protege-o de situações que comprometam a imagem profissional, dá a ele visibilidade para que pares e superiores percebam o seu progresso e até o patrocina, defendendo para ele melhores posições na organização. Além disso, quem se dispõe a ser mentor tem uma atitude de aceitação das pessoas, gosta de gente em sentido geral, gosta de ajudar e um interesse genuíno pode surgir especificamente em relação àquela pessoa que é seu mentorado. O mentor dispõe-se a aconselhar e a servir de “caixa de ressonância” confiável para explorar e avaliar conflitos internos do mentorado derivados de sua vida profissional. Se tiver conhecimento de ferramentas de coaching, como perguntas poderosas, feedback e escuta ativa, o mentor as utiliza. Também põe sua experiência a serviço do mentorado. Com isso, o mentorado ganha mais autoconhecimento e autoconfiança. A relação de mentoring pode propiciar uma abertura interpessoal que vai desde apenas uma maior aproximação até uma grande amizade. E mais: o mentor serve de modelo para o mentorado, seja pelos conhecimentos que detém, seja pelos valores defendidos e comportamentos demonstrados.

RH – E quanto ao coaching?
Paulo Erlich – Agora, sobre coaching. O coach ajuda o cliente em relação a questões de trabalho, carreira e da vida em geral, utiliza perguntas poderosas, feedback e escuta ativa. Um coach tem necessariamente uma atitude de aceitação do cliente independentemente de quem este seja. É fundamental que se desenvolva uma relação de confiança entre o coach e o cliente. Até aqui temos grandes semelhanças com o mentoring.

RH – Mas e as diferenças entre os dois processos?
Paulo Erlich – O coach muito raramente dá conselhos diretos, porque em princípio deve estimular o cliente a encontrar suas próprias respostas.

O mentor também faz isso, mas tem maior liberdade para aconselhar.

O coach não pode exercer o nível de proteção que o mentor consegue, até porque a organização não é o ambiente do coach: ele não está lá. Por esse mesmo motivo, não poderá oferecer visibilidade e patrocínio.

As relações de coaching são, em geral, de mais curta duração do que as de mentoring. A possibilidade de haver maiores níveis de abertura e aproximação interpessoal é menor no coaching do que no mentoring.

Por isso é mais provável para o mentor que para o coach que, ao longo do tempo do relacionamento, surja um interesse autêntico voltado para a pessoa do mentorado e que este também desenvolva um grau de admiração pelo seu mentor, tudo isso gerando mais confiança e intimidade. Outro aspecto a observar é que geralmente o mentor organizacional tem conhecimento e experiência profissionais específicos que servem ao mentorado, o que raramente vai acontecer numa relação de coaching. Bem, são muitos pontos a analisar e sei que não podemos nos estender muito, não é? Se valer uma simplificação, eu diria: mentoring é um processo mais abrangente, que pode conter aspectos do coaching.

RH – Em sua opinião, o mentoring ocupa o devido espaço no mercado corporativo brasileiro?
Paulo Erlich – Não. Ainda não ocupa o lugar que merece. Vejo duas razões para isso: de um lado, a falta de informação sobre mentoring; de outro, o espaço que o coaching está ocupando no mercado. O marketing docoaching é forte no país; o do mentoring quase não existe. Eu mesmo sou coach e vivo simultaneamente as duas experiências: atender clientes de coaching e implantar programas de mentoring organizacional. É mais comum as pessoas chegarem a mim já com uma noção ou opinião sobre coaching, mesmo que às vezes equivocada. Enquanto, quando menciono a palavra mentoring, logo surge a pergunta: “que é isso?”. Aí tenho de começar da estaca zero. Quando explico, em geral vem um encantamento com o processo e um grande interesse.

RH – Em que momento a empresa deve adotar o mentoring?
Paulo Erlich – Em diversas situações. Por exemplo: para aproveitar e reter talentos, adaptar recém-contratados, melhorar a qualidade na aprendizagem organizacional, preparar lideranças, facilitar processos de ascensão funcional e de sucessão, redefinir a cultura organizacional, estimular a criação e a sustentação de uma cultura de inovação, entre outras.

RH – Qualquer empresa pode instituir o mentoring como processo de desenvolvimento de talentos?
Paulo Erlich – Qualquer organização, seja privada, pública, não governamental, pequena, média, grande, nacional, multinacional, pode implantar um programa de mentoring alinhado com suas necessidades de desenvolvimento de pessoas. Em toda organização há colaboradores que precisam desenvolver-se. Basta identificar quem pode ajudar nesse processo, planejar e implementar o programa de mentoring.

RH – Quem é, de fato, apto para implantar o processo de mentoring?
Paulo Erlich – Sou muito suspeito para responder a essa pergunta, não acha? Mas tenho de lhe dizer o que sinceramente penso ser o melhor para organizações.

No atual momento, em que a imensa maioria delas não tem programas de mentoring implantados, é preciso que aprendam como isso deve ser feito da melhor maneira possível.

A consultoria externa é necessária, a menos que a empresa resolva estudar como fazer, o que pode exigir um tempo longo e um bom investimento. Uma vez implantado e concluído um primeiro programa, a área de Gestão de Pessoas provavelmente terá aprendido muito sobre o processo e talvez esteja em condições de levar adiante novos ciclos de mentoring. Na metodologia que utilizo, faz parte do processo a capacitação de um coordenador do programa e de supervisores dos relacionamentos. Essas pessoas vão internalizando a forma de implantar o programa. Assim, a consultoria vai aos poucos se tornando menos necessária.

RH – O que se torna primordial no mentoring?
Paulo Erlich – Um programa de mentoring precisa ser estruturado. Isso quer dizer que, entre outros aspectos, deve ser alinhado estrategicamente aos objetivos organizacionais, ter um método adequado para selecionar e treinar participantes e de formar os pares mentor-mentorado, oferecer suporte ao trabalho dos pares, ser comunicado internamente de modo que todos percebam o seu valor e ter um sistema de avaliação que permita conhecer os resultados para o mentorado, para o mentor e para a organização. Agora, tudo isso só funciona se houver apoio aberto da alta liderança, para que o programa seja realmente entendido como uma iniciativa valiosa por todos os gestores e eles também colaborem. Imagine que um programa seja construído nos melhores moldes, mas que gestores não liberem tempo de seus funcionários para atuarem como mentorados ou mentores. Não vai funcionar nunca.

RH – O mentoring também pode ser uma iniciativa pessoal do profissional ou necessariamente deve partir da organização?
Paulo Erlich – Pode, sim. E foi a partir da percepção de que isso existe que surgiram os programas dementoring organizacional. É preciso entender que tanto existe mentoring formal quanto mentoring informal. O informal, natural, é aquele em que a relação ocorre espontaneamente, por iniciativa de qualquer das partes e pode até acontecer que eles nem percebam que estão em um processo de mentoring. Mas, se a organização apenas esperar que o mentoring ocorra espontaneamente, dificilmente vai ter noção sobre o processo e seus resultados. Aí surge o mentoring formal, estruturado, que é uma iniciativa da organização.

RH – Que orientações o senhor daria para uma empresa que pretende adotar o mentoring como ferramenta de desenvolvimento de talentos?
Paulo Erlich – Eu diria, principalmente, que não construa um programa sem apoio da liderança e sem o mínimo de estrutura. Também não deixe de avaliar resultados, porque não adianta achar que é bom, que funciona e não apresentar dados que justifiquem o investimento. Um programa bem planejado e implantado gera bons resultados e isso tem de ser mostrado a todas as instâncias da organização, principalmente a quem está lá em cima.

RH – E para os profissionais que buscam o mentoring por iniciativa própria, o senhor deixaria alguma recomendação?
Paulo Erlich – Eu tive mentores naturais, desde muito pequeno, e tenho até hoje. Meus pais, meu avô materno, minha companheira, alguns amigos e alguns professores.. E também fui – e em certos casos ainda sou – mentor de meus filhos, de amigos, de alunos, de colaboradores das organizações por onde passei. Mas o fato é que até eu conhecer o que significa mentoring eu nunca tinha tido a mínima noção de que isso ocorria comigo. Se eu tivesse conhecimento antes, talvez tivesse aproveitado muito mais e valorizado ainda mais esses relacionamentos. Eu diria aos profissionais que buscam mentoring por iniciativa própria que, se quiserem ser mentorados, olhem para o seu entorno e descubram as pessoas com quem mais se identificam, que admiram e tentem aproximar-se delas, declarando com sinceridade seus objetivos. Para os que sentem a vocação de mentor, o conselho é o mesmo, porém com uma informação a mais: o mentoring também faz o mentor desenvolver-se e alcançar maiores níveis de satisfação pessoal e profissional. Então, não deixe passar essa oportunidade de ajudar e se ajudar.

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